Friday 18 December 2015

Estação V

Próxima estação: Escândalo - Desembarque ou morra. Estava deitado em algum banco perto da W3 Norte; O céu estava roxo-rosado. Um oficial da polícia pediu meus documentos. Enquanto eu abria os olhos, outro policial me amarrou e amordaçou. Não tive tempo de dizer nada e já estava na mesa do juiz, ouvindo o martelo repicar na mesa, uma, duas, três, trinta anos de reclusão, sem direito à fiança. No próximo segundo eu já estava tirando as roupas e sendo averiguado como número tal dando entrada no presídio.
Iria trabalhar como pintor. Pintava as calçadas dos pátios, as traves dos gols. Pintava as fossas, banheiros e paredes de cela. As I walk trough the valley of the shadow of death, I take a look in my life and realize there isn't much left...É a música do meu celular. Começa a ecoar por todo a prisão. Destrói as paredes com a reverberação.
O celular estava tocando faz tempo. Cheguei tarde ontem, quase seis da manhã, apenas tirei o sapato e a calça e me joguei no sofá. O celular.  Hoje acordei, fiz uma série de flexões, alongamento, cortei o cabelo e a barba, hidratei o rosto.
Hoje é dia de fazer de contas que sou pintor. Uma das minhas casas está em perfeito estado, e futuramente quero morar com minha gata lá. Então eu mesmo quero caprichar na pintura. A enfermeirinha que cuida da titia quer me ajudar. Eu sei o tipo de ajuda que ela quer dar.
Próxima estação - Pinheiros - Desembarque pelo lado esquerdo do trem. Táxi, táxi! Até Alto de Pinheiros por favor. Mas antes vamos passar numa loja de materiais para construção. O taxista estava de mal humor e nem olhou na minha cara. Pobre corno. A vida de pobre já é dura quando se está de bom humor. Pego meu tablet da Apple e confiro algumas mensagens.
Lembrei do pesadelo de hoje de manhã. Prometi para minha namorada que iriamos viajar para Brasília. Disse ser uma cidade muito arborizada e segura.
Pode passar no débito. Lixas, rolos, pincéis, tintas, solventes, diluidores, estopas, óleo, sprays, baldes, recipientes para manipular tinta, fita crepe, jornais usados. Quando terminei de colar os jornais nas bordas dos pisos com fita crepe, além das tomadas, carregadores, cinzeiros, alarmes, etc, tomei uma cerveja, de umas caixas que estavam na geladeira.
Oi, vim te ajudar. Essa é uma das enfermeiras que tomam conta da Tia Margarida. Ela veio de salto alto pintar a casa. Unhas feitas, batom vermelho, mini saia preta cortando o coração. Peguei a máquina de lixar e comecei pelas paredes maiores. Ela ainda tinha ido se trocar. Colocou uma bermudinha do tamanho da calcinha, preta como a mini saia. Um top que deixava a barriga durinha em exibição. Ela tava muito gostosa.
Pode pegar o rolo e começar a pintar por aqui. Não disse que queria ajudar? Imaginei enquanto corria para o outro quarto para terminar de lixar. No fundo eu não amo minha namorada. Quero casar com ela porque achei uma pessoa decente e capaz de administrar uma família junto comigo. Essa enfermeira acha que vai conseguir se aproveitar de mim fácil. Eu não sou desse tipo de homem que deixa as mulheres verem sua baba escorrendo.
Eu acho sexo até legal, mas não fico correndo atrás. Essa enfermeira pode trabalhar pra mim. É nisso que estou pensando. Essa casa não está no meu nome. Toda documentação oficial está em nome da minha namorada. Ela não sabe disso ainda, vai ser um presente de casamento junto com uma viagem para o Marrocos e um Chrysler na garagem.
Quando deu a tardezinha o calor começou a tirar nossas roupas. Eu tirei a camiseta. Ela tirou o top. Estava sem nada por baixo, e eu vi aqueles peitos quase virgens, com os mamilos ainda meio branco e rosado, em um formato de um seio que parece ainda estar em desenvolvimento. Eram pequenos e rígidos, e quando ela levantou o top só encarei por costume. Os peitos delas eram idênticos aos da novinha que Miguel Corleone casou na Sicília, enquanto estava foragido.
Pergunto se Leonardo da Vinci já pintou um quarto. É realmente muito trabalhoso. E ela ficou impressionada pelo fato deu não ficar pagando pau pros peitinhos deliciosos dela. (eu quero dizer com isso que era só eu pegar na mão dela e dar um beijo pra tudo começar) Na hora que ela abaixou para misturar a tinta ao solvente ouvi um leve chiado. Ela peidou. Fiz de conta que nem notei, mas o cheiro parecia urubu estragado. Ela olha pra mim e isso me assusta e excita ao mesmo tempo. A qualquer momento posso ser agarrado à força. Você gostaria de trabalhar pra mim? Mas não tem nada a ver com enfermagem.
Sequei bem os peitos dela até que ela ficasse envergonhada e cruzasse os braços por cima deles. Você é muito bonita mas não é assim que vamos chegar em algum lugar. Você sabe que eu sou noivo de alguém. Você mesma tem um namorado. A gente terminou semana passada. Eu não posso dar o que você quer, mas você pode trabalhar pra mim. Quer ficar rica não é? Está disposta a tudo?
Não quero me prostituir. Eu respirei fundo e pensei muito antes de falar. Bota uma camisa, eu não consigo parar de olhar pros seus peitos. Ela corou. Não sei porque lembrei da minha mãe. Ela faleceu eu ainda tinha seis anos, dois meses e treze dias. Quase não lembro do rosto dela. A voz é fantasmagórica.
Minha mãe era do tipo servidora pública e fumava dois maços de cigarro por dia. Ela queria que eu fosse médico. Desde que minha mãe morreu, ligada à aparelhos de oxigênio nunca mais fui o mesmo. Quando tinha dezesseis anos já tinha dinheiro para não precisar trabalhar mais nunca. Como não posso colocar esse dinheiro no banco, crio alternativas para limpar o dinheiro sujo. Hoje eu tenho 144 imóveis em nomes de laranjas só na cidade de São Paulo. Hoje, quer dizer, década de 90.
Sou dono de quatro cartéis de taxistas e de duas empresas de transporte público. Sou acionista do metrô, tenho 33 lojas de carro espalhadas pela cidade, duas faculdades e uma empresa de segurança privada. Eu quero um banco ou uma financeira. Sonhar nunca é demais.
E ainda tem muito dinheiro que eu não sei nem o que fazer com ele. Guardo as notas em um depósito, enterrado em um subsolo secreto, protegido contra a umidade, calor, água e fogo. Eu sempre ando com mais ou menos meio milhão disponível. Na minha conta bancária o maior saque que já fiz foi de duzentos reais. É sempre bom ficar esperto com o sistema.
O próximo passo é conseguir financiar a carreira de algum político. Essa enfermeira pode ser útil. Quando terminamos de pintar, tomamos banho separadamente e paguei um jantar caro pra ela. Obrigado pela ajuda. As vezes eu gosto de fazer o próprio trabalho. Eu quero trabalhar com você. Me passa o seu celular. Eu vou te ligar.
Agora falta duas horas para encontrar meu bebê. Já era pra moto ter passado. Lá vem ela. Vai, vai, sobe logo porra. Depois eu explico, vamo! Não precisava explicar nada. Vàrias sirenes tocavam a sinfonia do desespero. Mas essa daqui já passou por coisas piores. Entramos num beco, deixamos a moto na porta e corremos para o esgoto.
Eu fiz o serviço, estava tudo como planejado. Dai quando eu liguei a moto pra sair chegaram as viaturas. Falou tremendo enquanto tentava acender o cigarro. Você fez aquilo que eu te pedi? Tá, ele tá dormindo no inferno uma hora dessas. Então ache  um jeito de fugir. Eu não posso ficar aqui a noite toda. Tenho um encontro com minha namorada. Ela riu. Eu você nunca chama pra sair né? Qualquer hora quem sabe, respondi. Comprar rosas e passar um perfume no corpo. Depois dessa noite vou para a Capital do pais. Vou para qualquer lugar onde eu possa desenvolver minha empresa. Porque eu lembrei da minha mãe?

Crônica improvisada.

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